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Carta de apreciação a Tetsuya Nomura

Tetsuya Nomura é japonês. É japonês e trabalhou em mais de um Final Fantasy. Características básicas para identificarmos um devorador de mundos.

Tetsuya Nomura nasceu em 8 de Outubro de 1970, em Kouchi. Na Square, trabalhou como o designer de monstros em Final Fantasy V e em mais uma caralhada de coisa que todo mundo conhece: Final Fantasy VII, Kingdom Hearts, The World Ends With You, Brave Fencer Musashi. Conhecido por criar Cloud e Lightning, além de destruir o imaculado Final Fantasy de Yoshitaka Amano e Hironobu Sakaguchi.

Tetsuya Nomura também é responsável pelo crossover mais doente dos video games: Kingdom Hearts. Já não bastava estragar Final Fantasy, o cara se meteu e foi lá e estragou O PATO DONALD. Puta que me pariu, que porra é essa, o maluco meteu uns zipper no chapéu dele, é isso mesmo? Vai pro caralho japonês maluco.

“Belts and Zippers”.
Desde 2002 quando houve a realização coletiva de que o vestido da Lulu de Final Fantasy X era um monte de cinto misturado e que talvez o Sora tivesse zippers demais, foi essa a frase que ficou associada a Tetsuya Nomura. Em 2002 éramos todos adolescentes, se não crianças. É óbvio que é engraçado, é óbvio que quanto mais você conseguir zoar o jogo desse japonês fumado sobre coração e escuridão mais pontinhos você ganha, indiferente de em casa você estar chorando o lago Guaíba inteiro só porque o Riku apareceu de novo. Tetsuya Nomura foi longe demais e devia ser parado.
Mas Tetsuya Nomura não para, ao contrário, ele vai cada vez mais longe quanto mais é confrontado. É um birrento e me identifico.
E ele pode ser um, porque ele consegue responder a altura.

Não sei quantos que estão lendo já tentaram desenhar a sério alguma vez na vida. Eu venho tentando há 10 anos e digo com firmeza que criar personagens interessantes e ao mesmo tempo que pareçam gente é uma façanha que deveria ser celebrada muito mais do que é. Mas não é isso que vou argumentar em favor de Tetsuya Nomura, até porque não há o que argumentar quando seus olhos conseguem enxergar corretamente. “Belts and Zippers” é engraçado, mas só é usado como argumento sério sendo resquício de uma época onde a gente achava que “overdesigned” significava alguma coisa. Há algo a se pensar quando a obra de alguém consegue atingir tanta gente ao mesmo tempo e fazer elas pensarem “Eu quero ser esse cara”.
Não há só maestria de técnica. Há uma certa qualidade intangível para as suas ilustrações. Elas são… “macias”, mas ao mesmo tempo expressivas até demais. O sorriso do Sora é contagiante, a cara de desinteressado do Neku nos cria empatia, o sorriso maroto do Laguna nos lembra aquele amigo traquinas. Há um profundo entendimento do meio e tom que está sendo trabalhado. Enquanto Final Fantasy pede por personagens mais realistas, Kingdom Hearts mistura anime com Disney e TWEWY (mais a frente) abusa de sombras chapadas. Toda arte ainda parece ter sida feita por ele, mas com sensibilidades diferentes. Há um trabalho de composição absurdo, onde seu olho é guiado exatamente para onde ele quer, onde ele usa e abusa de personagens para indicarem um ponto focal da imagem, onde a composição em si já é quase uma outra ilustração por si só.

Não me levem a mal, eu amo a arte de Yoshitaka Amano, é incomparável. Ela é difícil de ser emulada, ainda mais levando em conta quando a pessoa tem que desejar fazê-lo em primeiro lugar. Há um nível de maestria envolvido muito grande para conseguir comunicar ao resto do mundo o que você está desenhando, mais ainda se você for Yoshitaka Amano. Tetsuya Nomura, por outro lado, é o que Akira Toriyama foi para os mangás e aspirantes desse estilo (em menor impacto, claro). Sua arte é mais palpável, mais fácil de ser representada. Não é a toa que quando lembramos de personagens antigos de Final Fantasy, lembramos da reimaginação que ele fez deles para Dissidia.
Aliás, quantos de nós não conhecemos aquele amigo que ficou fera em desenho porque curtia desenhar o Goku toda semana quando aparecia? Quem já usou dois segundos de DeviantArt em 2005 sabe que o efeito era parecido com o Nomura.

The World Ends With You é uma extensão do que torna Tetsuya Nomura tão especial. É um jogo que numa escala de 0 – 10 urbanisse, a nota dele é “só menos que Jet Set Radio”. Apesar de inventar maluquices como o modelito do Sora ser um macacão por baixo de uma jaqueta, Tetsuya Nomura claramente gosta de moda. TWEWY mostra sua versatilidade e sua maestria em definir cada personagem exatamente pelo que ele já é. Seus modelitos são simples e expressam o suficiente nesse jogo, se em algum momento ele exagera nos designs, é por pura escolha, não porque não consegue o contrário. Não só isso, como é conhecido por querer complicar a vida dos artistas 3D, para que seus modelitos complexos puxem o limite do jogo. É um arrombado mesmo.

Recentemente ele trabalhou com outro Tetsuya maluco: Tetsuya Takahashi, criador da série Xeno. Aparentemente sempre teve vontade de trabalhar com ele, desde que Nomura supostamente trabalharia em Xenogears. Os cinco personagens que Nomura desenhou são essenciais para a história do jogo, então é de se esperar que ambos saíram extremamente satisfeitos com o resultado final. Apesar de se acalmar com os cintos e zippers, todos os seus personagens ainda passam aquele ar fantasioso e místico, cada um sendo delineado certinho pelo que foi planejado para ele.

Me incomoda que as pessoas torçam o nariz ou usem Tetsuya Nomura como exemplo de mau design. Meus olhos ao menos me mostram o contrário. Um artista que consegue que o Donald e o Pateta fiquem coesos perto de um garoto anime de 13 anos merece meu respeito infinito, tanto como artista amador, quanto consumidor de suas obras. Como que alguém olha, vê uma gama enorme de expressões e cores sendo utilizadas e interpreta como uma péssima ilustração está além do meu domínio. Há quem vá dizer que tem toda a questão da Lightning ser igual ao Cloud e o escambau que, indiferente de ser verdade ou não, só nos resta perguntar: e daí? Um caso isolado, que simplesmente não diminui a compreensão de nenhum dos dois personagens, agora impacta todo o resto que o artista já fez? Se houver mais casos assim, em que Tetsuya Nomura de fato só consiga fazer o mesmo personagem, quero que seja encaminhado diretamente para mim ou nos comentários, pois não acredito. (Piadas com Kingdom Hearts, quem as fizer será EXTERMINADO.)
Assim, esse texto foi concebido exatamente como é pra ser: uma carta aberta de apreciação a um ilustrador que definitivamente me inspirou e continua me inspirando até hoje. É também um desafio, pra quem ler isso e se acha justificado em falar mal de sua arte, para que me apresente argumentos de verdade, que critique a composição de suas peças, a anatomia, o character design e assim por diante. Recentemente me disseram, numa discussão boba por ai, que eu não me importava com design e coisas assim. Espero que esse texto sirva para remediar e muito essa acusação, pois para mim a melhor forma de se importar com algo é celebrar o que é excelente.
P.S: Quanto à sua carreira de Game Designer penso semelhante, mas é papo para outro dia.

Lucinna
Fantasma da sociedade com opiniões até demais. Vive por Nintendo, musica de videogame e Square-Enix. Intuição correta em 9 vezes de 10, de acordo com estudos.

    2 Comentários

    1. texto bem divertido de ler ao mesmo tempo que informativo, parabéns luiggi!

    2. Bom texto, Afro!
      Eu gosto muito das artes do Nomura. Não só pelo que ele é conhecido, mas por ver a progressão da arte dele.
      Ver como ele fazia desenhos tão baseados em anime e mangá para hoje em dia serem mais realistas e um estilo mais único.
      E uma parada que me enche os olhos são as artworks que ele fez para o primeiro Dissidia, onde ele desenhou cada um dos heróis, porém com os designs das artes do Amano. Ficou um resultado muito interessante ao meu ver.

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